sexta-feira, 23 de março de 2012

Candomblé se despede de Ebomi Cidália


 
Sabedoria, dignidade, carisma e doação. Estas foram as características da ebomi Cidália Soledade, 82 anos, destacadas e repetidas pelas pessoas que compareceram ao seu  sepultamento ocorrido na tarde de ontem no cemitério Jardim da Saudade.
“Fica um vácuo. A capacidade que ela tinha de socializar sua sabedoria não se adquire. A  pessoa nasce assim. Iroko teve uma filha à sua altura. Só podemos agradecer  e pedir que essa luz continue a nos orientar”, disse o tata de inquice Anselmo Santos, o mais alto sacerdote do  Terreiro Mokambo.  O vasto conhecimento religioso fez dela uma referência sempre que era necessária uma tomada de decisão ou esclarecimento sobre diversos assuntos.
 “Sempre estava disposta para orientar. Na última vez que a encontrei foi quando precisávamos definir sobre as peças de candomblé que estavam no IML. Mãe Cidália que nos ajudou a decidir como iríamos proceder”, contou a doutora em educação Vanda Machado, referindo-se às peças ligadas ao candomblé e à cultura afro-brasileira que, até 2010, estavam sob a guarda do Departamento de Polícia Técnica (DPT).
Homenagem
Religiosos de vários terreiros prestaram homenagem à filha de Iroko que foi consagrada, aos 7 anos de idade, por Mãe Menininha do Gantois. “Era acolhedora, um ombro amigo e gostava de passar as informações que tinha. Peço aos ancestrais que iluminem ainda mais o caminho dela”, disse ebomi Nice de Oyá do terreiro Casa Branca.
“Além da relevância pelo profundo nível de informação sobre o candomblé, ela sempre estava com mãe Stella participando das cerimônias do Afonjá”, afirmou o ogã José de Ribamar Feitosa, presidente da Sociedade Cruz Santa do Axé Opô Afonjá.
Como explica o doutorando em história social e religioso do candomblé Jaime Sodré, a importância de ebomi Cidália contemplava toda a religião.
“Ela era a memória para toda a religião, dentro de qualquer casa, independentemente da nação. Era a guardiã de segredos que mantinham o padrão africano do culto. Sem contar a influência sobre a vida religiosa de uma infinidade de pessoas”, disse o autor do título Enciclopédia do Candomblé, que se tornou uma definição perfeita para ebomi Cidália.
“Agora ela vai escrever mais um capítulo perto de Olorum. Também ganhamos, pois ela continuará cuidando da gente”, completou Jaime Sodré, que é xicarangoma (sacerdote músico) do terreiro Tanuri Junçara e oloê (espécie de conselheiro ) do Bogum.
Afeto
“Falar de minha filha é falar de amor. Ela sempre tratou a religião com muita seriedade. E eu sempre fui muito feliz por Iroko ter me escolhido para cuidar dele. Ela sabia muito e ajudava vários terreiros na manutenção da essência do axé”, destacou a equede de Iroko Glicéria Vasconcelos, do Ilê Iyá Omin Asé Iyá Massê, mais conhecido como Terreiro do Gantois.
A lembrança do babalorixá Silvanilton da Mata, o Babá Pecê, é anterior  à trajetória religiosa. “Sempre fomos vizinhos. Ela me viu crescer, ajudou na minha criação e me incentivou quando assumi meu cargo. Com ela eu chorava, conversava, me consolava, desabafava e pedia orientação”, relatou.
Ebomi Cidália Soledade morreu, na manhã da última terça-feira, no Hospital Naval, situado no Comércio, por conta de complicações derivadas de um problema renal.

Nenhum comentário:

Postar um comentário